segunda-feira, 14 de maio de 2012

As várias faces da jornada do herói [Paula Pinheiro] #2




Quatro amigos fazem uma viagem a Las Vegas a fim de dar a um deles uma despedida de solteiro inesquecível. Ironicamente, quando acordam no dia seguinte, nenhum deles se lembra de nada do que aconteceu – nem de onde está o noivo. Esse é o resumo de Se beber não case, comédia lançada em 2009 que foi sucesso de bilheteria e ganhou uma sequência.

A narrativa tem como principais quatro amigos: Doug, o noivo, que quer apenas uma despedida de solteiro tranquila; Phil, o adulto irresponsável que odeia sua vida de casado; Stu, preso num relacionamento em que é constantemente oprimido; e Alan, o "esquisitão" que só foi convidado por ser parente da noiva. Apesar de ser um dos principais, Doug não é um dos heróis do filme, uma vez que não passa pela jornada ao longo da história – esse personagem é antes a recompensa buscada pelos heróis do que um herói propriamente dito.

As transformações porque passam Phil, Stu e Alan ficam evidentes nas cenas finais do filme: Phil abraça sua esposa e filhos, Stu cria coragem para terminar o relacionamento, e Alan se torna parte do grupo, deixando de ser o esquisito e se tornando um deles. Contudo, apesar de ser possível identificar momentos que marcam mudanças nesses personagens e na dinâmica do grupo, essas mudanças não estão necessariamente relacionadas ao que é retrata nas cenas finais.



Luzes da Ribalta, drama¹ de Charles Chaplin lançado em 1952, também se baseia em mais de um herói. O filme conta a história de Calveiro, um comediante aposentado que se vê com a tarefa de cuidar de uma jovem dançarina, Terry, atormentada por diversos problemas psicológicos que entram no caminho de sua carreira. Por ser de outra época, o filme segue um modelo diferente de Se beber não case. Seu ritmo é perceptivelmente mais lento e a história é mais longa, sendo composta de diversas "micro-jornadas" que dão continuidade uma a outra.

Algo que fica muito evidente em Luzes da Ribalta é a dinâmica de morte e renascimento dos heróis do filme. Campbell afirma² que o herói deve morrer simbolicamente (de forma a aniquilar seu ego) para renascer, também simbolicamente, com uma melhor percepção do mundo ao seu redor. Em Luzes da Ribalta, essa dinâmica ocorre o tempo todo, alternando os heróis: quando Terry está debilitada, Calveiro assume o papel de mentor que oferece apoio; mas assim que esse mentor sucumbe, passando por sua morte simbólica, Terry renasce, mais iluminada e segura, e toma para si o papel de mentora. Isso acontece de maneira alternada em diversos momentos filme.

Vários estágios da jornada ficaram evidentes nos dois filmes; de formas diferentes em cada um deles, claro. Contudo, por motivos de limite de caracteres, abordarei mais esses estágios no meu relatório final.

¹ A proposta original era que fossem analisados filmes de mesmo gênero a cada quinzena. Quando notei o erro no cronograma, considerei trocar de filmes, mas concluí que Luzes da Ribalta, devido principalmente ao contexto de produção cinematográfica em que foi realizado, ofereceria uma análise interessante, e, portanto, decidi mantê-lo.

² CAMPBELL, J. O herói de mil faces. 9ª edição. São Paulo: Editora Cultrix/Pensamento, 2004.

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