sexta-feira, 22 de junho de 2012

Nuberu Bagu - A realidade cruel e a reflexão do surreal [Johnatan Ferreira] #5




A estética de Shohei Imamura é a que mais valoriza o real no que se trata da nouvelle vague. Ele vai até o ambiente rural e tenta captar vislumbres de uma verdade japonesa que se encontra naquele cotidiano do agricultor e do camponês. Longe de discussões politicas ou do deslocamento urbano. Imamura filma o interior do Japão e a partir daí desenvolve suas preocupações com o universo dos sonhos e alimenta os inúmeros elementos que o contrapõe daquele cinema de Yasujiro Ozu, ao qual o próprio Imamura já fora assistente nos seus anos de Shochiku¹.

Mas Shohei vai além, e quer tragar com a câmera os instintos animalescos dos homens, a selvageria escondida pela civilidade e não poupa sexo, tragédia e brutalidade para mostrar isso. Nesse meio absurdo e caótico, surge uma figura feminina que se ergue com força e potencialidade, e se é acometida com armas vis, utilizará apenas elas para contra-atacar. Como David Desser coloca em “Eros plus Massacre”²,  em Imamura a mulher revida, é apaixonada e tão irresponsável e egoísta quanto os homens que as cercam.  No filme A mulher inseto (Nippon konchuki,1963)  ele utiliza uma frieza de um cientista social para filmar a mulher que trabalha, em Desejo Profano (Akai Satsui, 1964) há o feminino doméstico e a constante violação sexual da mulher que somente na ferocidade sobrevive nesse meio corruptível, chegando em Os Pornógrafos (Jinruigaku nyûmon,1965) que desvinculado de qualquer grande produtora e privilegiando uma plasticidade fantástica ele satiriza a luxúria dos homens.

A Mulher das Dunas


Hiroshi Teshigara por sua vez, apesar de também inserir o papel feminino nos seus filmes diferente da do cinema clássico, utiliza o enfoque surreal em pleno contato com essa veia da realidade documental para abordar o corpo humano fragmentado, identidades que se perdem em meio ao absurdo fantasioso da reflexão e a crueza do real. O diretor abusa de uma estética incrível e de uma beleza plástica assustadora para compor seus planos e enquadramentos fantásticos. Em A Mulher das Dunas (Suna no onna,1964), um dos filmes mais impressionantes que eu já vi dessa geração do cinema japonês, há uma construção de um mundo obsessivo e único em que a areia, a loucura e o sexo imperam nesse ambiente árido. Com a  Cilada (Otoshiana,1962) e O rosto de um outro  (Tanin no kao, 1966) Teshigahara formula ponderações ainda mais profundas sobre os homens na sociedade e suas crises que os desarticulam.



cena de A Mulher das Dunas

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¹ NAGIB, Lucia. Em torno da nouvelle vague japonesa. Campinas, SP: UNICAMP, 1993. 183p.
² DESSER, David, Eros plus Massacre – An Introduction to the Japanese New Wave, Indiana University Press, 1988

Um comentário:

  1. Oi, Johnatan!

    Pelos seus posts, é possível perceber que você se dedicou à observação do movimento no Japão e que deu conta de ver e refletir sobre os filmes propostos, a despeito de serem muitos!

    Parabéns!

    Um abraço,

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